Paccoby
A criança tem uma mente que absorve o mundo. Como uma esponja. Mas não a da pia. A do mar. E isso faz toda a diferença.

Quando uma criança nasce, não sabe quase nada sobre o mundo. Tem o mundo inteiro para descobrir. Rápido. Em três anos, ela conversa, entende histórias e se movimenta bem! É muita coisa, muito rápido. Nenhum adulto aprende uma língua tão bem quanto uma criança. Nenhum adulto recupera movimentos perdidos como uma criança os adquire. Para isso, as crianças têm uma mente especial.

Elas têm uma mente absorvente, que foi descoberta por Maria Montessori. E desde Montessori, as pessoas dizem que essa mente é como uma esponja, mas pouca gente compreende que não é uma esponja de banho ou de lavar-louças. É essa aqui:

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A esponja do mar absorve ativamente o ambiente à sua volta. A criança também. Do mesmo jeito que no mar, a esponja não espera ninguém a apertar para absorver água, a criança não precisa que a gente a estimule para absorver o mundo.

A esponja absorve tudo. No início, a mente da criança é inconsciente. Isso quer dizer que não há escolha de o que absorver, mas, teoricamente, ela retém aquilo que é importante e deixa ir o que não é. As crianças absorvem, por exemplo, fala humana, com muito mais interesse e intensidade do que latidos, miados ou sons de aparelhos eletrônicos.

O problema é que existem estímulos tóxicos que as crianças recebem. Mais ou menos como os poluentes que as esponjas absorvem, os estímulos tóxicos podem ser filtrados ou não. Se uma criança passa por uma experiência ruim, mas é só uma vez, ela pode não sofrer com isso. Se passa por experiências ruins de vez em quando, mas não são muito graves, e ela tem um refúgio (uma boa casa, uma boa família, uma boa escola), pode conseguir lidar com isso. Mas às vezes os estímulos tóxicos são muitos.

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Quando isso acontece, a esponja para de filtrar. Entope. A esponja morre. A criança, por outro lado, continua viva, e sofre.

Se a criança vive em um ambiente violento, agressivo, apressado, sofre. Fica mais ansiosa, perde habilidade de lidar com stress e frustração, perde resiliência e força de vontade.

O ambiente errado alimenta mal a mente da criança, e ela definha. Isso é diferente de aprender coisas ruins. Uma criança que vive em uma casa desrespeitosa não só aprende desrespeito. Ela se transforma em alguém que vive o desrespeito como algo normal, e que sofre suas consequências como se isso fosse normal também. Baixa autoestima, ansiedade, intranquilidade, dificuldade de dormir, choro constante. E nada disso lhe parece absurdo, mesmo na vida adulta.

A criança sobrevive, é verdade. Pode sobreviver por muitas décadas. Mas não se desenvolve completamente. Sobrevive com imensas dificuldades interiores.

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Se uma criança que absorve um ambiente ruim torna-se um humano com feridas e traumas, aquela que tem a chance de um bom ambiente também o absorve. E funciona como uma boa alimentação. A criança que pode absorver um mundo bom desenvolve-se bem, inteira, capaz de lidar com o que a vida lhe oferecer.

A mente absorvente é um milagre. Dá para explicar cientificamente, pela plasticidade neural da criança pequena e pelo surgimento de uma imensa quantidade de sinapses. Mesmo assim, a mente absorvente permanece sendo um milagre.

É um milagre que uma criança desenvolva tanto em tão pouco tempo, absorva tanto em tão pouco tempo, se transforme tanto e tão rápido.

O humano não vem pronto, seu destino não está traçado. Ele pode ser tudo. Seu ambiente vai participar ativamente dessa construção, mas cada ser humano é portador de um novo milagre. Aí, na mente-esponja da criança, está a esperança do mundo.



Fonte: Lar Montessori | Gabriel Salomão